Octavia Butler e a Fênix


"Para renascer das próprias cinzas, a Fênix, primeiro, tem que queimar."
Octavia Butler (22/06/1947 - 24/02/2006)


Primeiro as primeiras coisas. Qual é a pronúncia correta dessa palavra: fênix?

Segundo as segundas coisas. Não existe consenso na pronúncia, logo não existe o correto, necessariamente, existe o mais usado, o maus comum. Isso, entretanto, depende do local onde moramos, pois isso, de uma maneira geral, é o que vai determinar o que mais ouvimos.

O Aurélio recomenda que a pronúncia do X seja como S, como na palavra lápis. Já outros dicionários apontam, sem uma recomendação específica, que a pronúncia pode ser como em clímax, ou seja, com o som de KS no final.

Eu, como sempre ouvi fêni[KS], pronuncio assim. É mais natural para mim.

🐦

Octavia Estelle Butler foi uma escritora de ficção científica, nascida na Califórnia, EUA. Recebeu inúmeros prêmios, dentre eles, o Hugo e o Nebula, que são reconhecidamente os prêmios mais importantes dentro da comunidade da FC. Em 2010, quatro anos após a sua morte causada por um derrame cerebral, ela foi indicada para o Salão da Fama ('Hall of Fame') da FC e Fantasia, do qual fazem parte nomes como Isaac Asimov, Arthur C. Clarke, Mary Shelley e Philip K Dick, por exemplo.

O fato de ela, além de ser mulher, negra, e de ter nascido quando a discriminação era ainda muito maior e aberta que hoje, nos mostra o quanto ela foi não apenas pioneira em fazer o que fez, mas em fazer com excelência tudo que produziu.

O primeiro livro dela que tive a oportunidade de ler foi Kindred (Laços de Sangue, em Português) e foi aí que me apaixonei pela sua escrita. Li o livro em mais ou menos duas semanas durante a pandemia e fiquei impressionado, não apenas com a história em si, mas com a escrita. O livro trata sobre a escravidão e sobre viagem no tempo. Na época, quando terminei de ler, escrevi o seguinte:

" What a wonderful book! Harrowing and hard to swallow sometimes, not for the writing, but for the truths it tells. It comes to show that, even if we are living a hard life today, no matter what challenges we're facing, there's no better time to live than now, whenever that is."

Adapto: "Que livro maravilhoso! Angustiante, lacerante e duro de descer em alguns momentos, não pela escrita, mas pelas verdade que ele encerra. Ele vem nos mostrar que, mesmo que estejamos vivendo uma vida dura e difícil hoje, não importa quais desafios estejamos enfrentando, não há melhor momento para viver do que agora, quando quer que estejamos vivendo."

Falei recentemente sobre esse assunto aqui mesmo no blog, nessa minha Jornada para os 50 e percebo que isso é um tema recorrente em minha mente, já que escrevi sobre isso há 4 anos. Tenho certeza, entretanto, que já penso assim há bastante tempo.

Bom, mas decidi escrever sobre Octavia não apenas por Kindred. É que, neste momento, estou terminando a leitura de mais um dos livros dela. Desta vez estou no segundo, e último, livro da série chamada de 'Parable Series' (Série das Parábolas) ou 'Earthseed Series'  (Série Semente da Terra).

Os dois livros da série se chamam A Parábola do Semeador e A Parábola dos Talentos.

Preciso confessar algo. Tenho a pretensão de ler tudo que ela escreveu. Entretanto, tenho a mesma pretensão com muitos outros autores, logo, sei que não conseguirei. Tantos livros e tão pouco tempo... 😁 Sem saber exatamente do que se tratava, escolhi ler esses por causa do título. Amo parábolas e, sendo Espírita, gosto de ver interpretações e considerações diferentes sobre as parábolas de Jesus. Ora, unindo o útil a agradável, pensei eu, vamos ver do que se tratam esses livros.

Surpresa!

Não é uma recontagem, nem uma história religiosa, mas tem muita religião nela, o lado bom, mas também o lado ruim, odioso do fanaticismo religioso.

Lançada em 1993, ela cria uma ficção do futuro, mas não do futuro distante. Ela pula apenas 31 anos. Se você fez as contas mentais, vai perceber que, se estiver lendo próximo de quando escrevo, a história começa em 2024, ou seja, agora!

O primeiro relato do livro se dá no Sábado, dia 20 de Julho de 2024, ou seja, em aproximadamente três meses. Isso também me surpreendeu, pois não tinha ideia.

A história é contada em formato de diário, com a protagonista, Lauren Oya Olamina, escrevendo em seu diário os acontecimentos de sua época. Guardadas as devidas proporções, é como o Diário de Anne Frank. 

Apesar de ser uma ficção, os relatos são tão incríveis e impressionantes. São tão realistas que a gente parece estar vendo o que está acontecendo nas cidades e nos caminhos por onde a história é relatada. Uma pequena sinopse que encontrei, nos dá um excelente ideia do contexto e da história em si.
"Quando uma crise ambiental e econômica leva ao caos social, nem mesmo os bairros murados estão seguros. Em uma noite de fogo e morte, Lauren Olamina, a jovem filha de um pastor, perde sua família, seu lar e se aventura pelas terras americanas desprotegidas. Mas o que começa como uma fuga pela sobrevivência acaba levando a algo muito maior: uma visão estonteante do destino humano ... e ao nascimento de uma nova fé."
Fazia tempo que eu não tinha sentimentos de raiva e rancor com algo que eu leio. O segundo, e último, livro da série "A Parábola dos Talentos" foi capaz de fazer isso comigo. Na verdade ainda está sendo, pois não terminei ainda. Estou no penúltimo capítulo e, mesmo agora, ao escrever, sinto aquele gosto amargo na boca de quem está presenciando injustiças e se sente completamente impotente para fazer algo para mudar a situação.

Lauren, a partir de onde a gente a maior parte da história ser contada, é ajudada no segundo livro por outros narradores, que também vão contando partes da história do ponto de vista deles. Assim, a gente vai vendo o mundo por perspectivas diferentes e conhecendo outros locais aos quais ela não tem acesso.

O livro, ou melhor, a série - que infelizmente não pode ser completada antes de ela morrer em 2006, é uma brilhante ficção dos nossos dias. Infelizmente, não de dias melhores a curto prazo, mas de para onde poderíamos - ou poderemos - ir caso nos deixemos levar pelos radicalismos e fanatismos - sejam eles religiosos, ou não - daqueles que nos governam e que enxergam apenas o próprio umbigo.

Uma das grandes lições que tiro da leitura dos três livros é que a gente precisa se preparar. Nós temos controle de algumas poucas coisas em nossas vidas. Uma das que podemos controlar é a de fazer e aprender tudo que pudermos com o máximo de consciência e amor, pois, no geral, esse amor e essa consciência nos preparam bem para podermos enfrentar adversidades que, certamente, advirão.

Muita coisa que vai acontecer conosco não depende diretamente de nossas escolhas de agora e nem de nossas ações desse momento - e, mesmo quando dependem - nós não sabemos quando, ou como, irão chegar.

Precisamos lembrar que nada é permanente, que tudo muda constantemente e que precisamos ter isso em mente, mas principalmente, no coração, pois sentindo e refletindo em nós a mudança que queremos para o mundo, nós moldamos o mundo. Nas palavras de Lauren, em seu livro chamado "Semente da Terra: Os Livros dos Vivos":
"Tudo o que você toca
Você muda.
Tudo o que você muda
Muda você.
A única verdade perene
É a mudança."
Arte da capa de A Parábola do Semeador por John Jude Palencar

Aceitemos a mudança, qualquer que seja ela. E, ao fazermos isso, mudemos com ela, sempre para melhor. Até que a nova mudança se apresente. Quando, então, se assim quisermos, mudaremos para melhor. Novamente.

Todos temos problemas e sempre teremos. Às vezes as dificuldades são maiores do que achamos que podemos dar conta.

Apesar disso, e utilizando a frase inicial, penso em todos nós como fênixes, que, mesmo "mortos", ressurgimos, nascemos de novo. O que precisamos nos dar conta e relembrarmos é que, para que possamos renascer, precisamos estar mortos.

Morrer e recomeçar, como no caso da fênix, é, em muitos momentos, se deixar queimar, até virar cinzas.

Das cinzas, quando esse momento chegar, ressurgir, renascer.

Trabalho e Esperança. Sempre!

Mackenzie Melo

P.s.1: eu sei o que escrevi sobre o livro Kindred e sei que demorei duas semanas para terminar de lê-lo pois catalogo minhas leituras no site Goodreads. Meu perfil é esse aqui.
P.s.2: às vezes começo um texto sabendo onde quero chegar. Muitas outras vezes não. Alguns terminam ligeiro. Outros se prolongam e se prolongam... Esse foi um desses longos. Que deveria ser ainda mais longo, mas decidi parar, senão eu não iria conseguir terminá-lo e iria ser mais um daqueles que foram começados e terminariam por ficar eternamente em formato de rascunho.
P.s.3: queria poder escrever mais sobre o assunto. Não necessariamente sobre Octavia Butler ou sobre os livros dela, mas sobre a ideia da religião que ela chama no livro de Earthseed (Sementes da Terra), baseada na ideia de que a "única verdade perene é a mudança". Talvez, quem sabe, numa outra oportunidade, volte ao tema. Vamos ver o que as mudanças me trarão.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

"Beati pauperes spiritu quoniam ipsorum est regnum caelorum"

Mouse Aquático

Michelangelo, arte e aprendizado